Era um vez... assim começam as histórias de encantar e de desencantar...
Era uma vez o Sol que vivia no seu castelo de altas ameias. Perto dele habitava a Lua... Manhã após manhã, o Sol erguia-se e estendia os seus braços pelo mundo que ansiosamente o esperava e o seu sorriso inundava as almas de todos aqueles que o contemplavam enlevados... os seus olhos eram o céu azul onde na noite escura caminhavam as estrelas. Esses olhos eram o caminho de todos os viajantes e era nesse azul que procuravam caminhos de luz, ternura, vida...
Perto dali, naquela morada perdida no meio de um deserto milenar, vivia a Lua. A Lua era a princesa de um reino de outrora e, quando a escuridão tapava os olhos do Sol, ela começava a despontar delicadamente nesse infinito de pontos cintilantes. Timidamente, ela ía iluminando a existência daqueles que procuravam na noite o sentido para a vida.Sol e Lua eram, afinal, os caminhantes de um mundo de sonho e mistério e caminhavam lado a lado sem nunca se terem encontrado.
Um dia, o Sol adormeceu no meio dos seus lençóis do mais puro cetim azul estelar, envolto nos seus dourados raios de luz e esqueceu-se de regressar ao seu castelo. A Lua, ergueu-se da sua cama de nuvens... vestiu a sua capa cintilante, ergueu-se nesse céu ainda azul e encontrou o Sol.
_ Quem és? -perguntou o Sol.
_ Eu sou a Lua... aquela que se passeia no céu do teu olhar e mostra o caminho aos viajantes.
-- Engraçado... nunca te tinha visto por aqui.
_ Eu também não, mas conhecia os teus raios que aqueciam a terra onde deixo o meu orvalho em cada manhã.
-- Gostava de ter adormecido há mais tempo para poder saudar-te como hoje.
_ Só hoje adormeceste e só hoje me poderás ver. Amanhã, quando eu me erguer, já não estarás aqui e jamais voltarás a enlear-me nos teus longos cabelos de oiro e a deixar-me passear no azul do teu olhar.
-- Mas eu quero ver-te... quero sentir-te nesse teu leito feito de nuvens e magia.
-- Sabes, muitas vezes julgamos querer e não queremos... muitas vezes nos deixamos trair por aquilo que julgamos ser... e não é.
-- Mesmo assim quero voltar a encontrar-te... quero sentir-me espelhado em ti.
-- Sim, Sol, poderás espelhar-te em mim sempre que esconderes os teus raios e vieres sentar-te a meu lado ciciando histórias de anões e duendes, de mestres e aprendizes...
-- Obrigado, Lua, assim farei. Até logo.
-- Até logo Sol.
A Lua partiu para mais uma das suas longas caminhadas pelo caminho das estrelas e o Sol recolheu-se aos seus aposentos reais. No dia seguinte, quando a Lua se aproximou para o acordar com os seus braços cobertos pela geada do amanhecer, o Sol, ofuscado pelo fulgor dos seus raios e estonteado pelo brilho das gotas do orvalho, não a reconheceu e vedou-lhe a entrada no seu castelo de largas ameias duras e impenetráveis. A Lua bateu à porta, mas a lava solidificada do Sol tornou-se demasiado dura para que ele percebesse que aquela era a Lua com quem partilhara a noite anterior... porque estava coberta com as gotas do orvalho da manhã.
Sol e Lua caminham agora no mesmo espaço sideral, mas separados pelo gélido muro do mutismo e da indiferença que transmitem aos homens dia após dia.
Maria Rosmaninho